sexta-feira, 9 de março de 2012

Memórias do Brasil


Acredito que nossa memória tenha capacidade pré-determinada (claro que alguns conseguem armazenar mais coisas que outros). Felizmente ou infelizmente a gente não consegue guardar na memória tudo o que aconteceu conosco. Às vezes queremos registrar na memória, mas os detalhes vão sumindo aos poucos, outras vezes queremos apagar da memória e de vez em quando ela dá algum sinal de vida.

Muita coisa aconteceu nos últimos anos e várias coisas já não estão mais claras em minha mente como antigamente (tem o fator idade também). Dá a impressão que as coisas novas vão substituindo as memórias antigas.

Bem, enquanto ainda lembro de algumas coisas, vou tentar deixar registrado aqui um  pouco de como era a minha (ou nossa - minha e da Claudia) vida no Brasil. Vou tentar mostrar apenas os últimos anos... para não tornar o post mega confuso e cansativo.

Morávamos em São Paulo, no bairro do Cambuci. Ali na Rua Alexandre Levi onde outrora construíram alguns conjuntos de apartamentos. Fica bem perto da Avenida do Estado e um pouco longe de qualquer metrô. Na época em que decidimos entrar nesse financiamento, era basicamente o único que cabia (e olhe lá) no nosso bolso.

O apartamento, apesar de ter 2 quartos, era pequeno e tinha uns 45m2 (incluindo a varandinha). Morávamos no 1o andar. O condomínio oferecia algumas opções de lazer como área para churrasco, piscina, quadra, sala de ginástica, salão de festas. Na prática a gente não usava muito.

Convivíamos (na verdade reclamávamos sem nunca ter solução) do vizinho adolescente que morava no andar de cima e ouvia música (vamos tentar chamar de música) bem alto. Aparentemente o síndico não tomava nenhuma providência, pois o pai do menino fazia parte do conselho. Ainda havia o nosso vizinho de andar que tinha rinite alérgica e espirrava em stereo - mas, não sei se dava para fazer alguma coisa. Bem, a construção não tinha isolamento acústico e a reverberação do som tornava os ruídos ainda piores.

A gente tinha 2 carros que usávamos para ir trabalhar. Se não me engano o meu rodízio era de quarta-feira e o da Clau era de quinta. Apesar de eu não gostar de dirigir, e de muitas vezes perder horas no trânsito, a melhor opção ainda era sustentar um carro e ir trabalhar de carro. Por exemplo, indo de transporte público eu levava em torno de 1h30 para chegar no trabalho e umas 2h para voltar (quando eu pegava o fretado da empresa até o metrô). De carro, eu saía um pouco mais cedo para evitar o trânsito e levava uns 40 minutos.

Sempre tentei ser muito produtivo durante o horário de trabalho, pois a qualidade de vida para mim era conseguir não ficar trabalhando até tarde "voluntariamente". Infelizmente também já recebi feed-backs negativos por eu não ficar até mais tarde como a maioria. Bem, devido ao trânsito da volta, umas 3 vezes por semana eu ia para a academia e ficava lá por 1h30 mais ou menos.

A rotina era basicamente essa, acordar cedo, ir ao trabalho, correr para entregar as coisas, participar de muitas reuniões (muitas vezes em diferentes prédios), ir para a academia de vez em quando, pegar um trânsito e voltar para a casa. Jantar alguma coisa, ver TV, navegar na Internet, dormir. Nos finais de semana a gente ia ao Shopping, assistia a algum filme, ia na casa dos familiares, combinava alguma coisa com amigos, às vezes combinava um churrasco, e nos feriados a gente pensava em fazer algo diferente como viajar. Nas férias a gente também tentava fazer um passeio mais legal e tentar descansar. Nas festas de final de ano a gente, ou passava com familiares, ou tentava fazer uma outra viagem.

Eu gostava bastante da hora do almoço, pois sempre (grande maioria das vezes) íamos em grupo. Tínhamos a opção de comer no restaurante da empresa, mas geralmente saíamos de carro para algum outro lugar próximo (geralmente no carro da amiga Helena e orientada pela amiga Élida). Geralmente íamos ao Shopping Interlagos ou SP Market. De vez em quando a gente fazia mais de 1 hora de almoço para irmos a lugares diferentes e sempre muito bons por sinal.

De vez em quando combinávamos um Game Night com amigos e escolhíamos o local e o que cada um ia levar. Geralmente ficávamos até madrugada jogando. Isso era muito divertido.

Sempre que saíamos de carro, rolava uma preocupação sobre segurança, horário que íamos chegar, por onde iríamos passar, etc. Vidros muitas vezes fechados (no farol então...).

Geralmente eu abastecia no posto perto de casa. O mecânico também ficava perto de casa (não sei porque todo mês basicamente alguma lanterna queimava).

Teve época que estudei inglês, teve outra época que fiz aulas de desenho e de vez em quando eu ia para a quiropraxia. Essas coisas quebravam um pouco a rotina, assim como as muitas vezes que a gente ia ao supermercado (particularmente eu sempre gostei de ir ao supermercado - menos quando está muvucado). A gente ia bastante no Dia%, mas havia também o Carrefour perto de casa também.

Os finais de semana, como eu disse, eram  preenchidos com passeios a casa de familiares ou eventualmente combinávamos alguma coisa com amigos. Até que dava para descansar bastante e sentir aquela depressãozinha de domingo à noite.

Tínhamos uma pessoa que limpava o apartamento e passava as roupas também (isso também contribuía bastante com a nossa qualidade de vida).

Meu passatempo basicamente era ler uma coisa ou outra, jogar video game, navegar na Internet (baixando coisas que muitas vezes eu não tinha tempo para ver ou ouvir), fazer tricô (sim, eu fazia tricô) ou algumas atividades do voluntariado (pelo PMI-SP).

Curtíamos muito ir ao Shopping Market Place por conta do cinema com lugar marcado, praça de alimentação, café Suplicy, voltinha na livraria cultura, e principalmente pela facilidade em estacionar (nos horários que a gente chegava geralmente). Também íamos ao Shopping Central Plaza por ser mais próximo do apartamento e não cobrar estacionamento.

Algumas coisas me estressavam: vizinho barulhento, gente folgada, jeitinho (dar uma de esperto), pessoas despreparadas para lidar com cliente (ainda mais quando eu era o cliente), muvuca, procurar vaga para estacionar. As coisas do trabalho que me estressaram já não são nada nada mais relevante hoje. Acho que essas são as primeiras coisas a irem sumindo... (que bom).

Coisas que desestressavam: comida da minha mãe ou da minha sogra/sogro, cochilar depois do almoço no final de semana, jogar video game, tricotar, ir ao Market Place, brincar com as sobrinhas, ouvir música no carro, almoço com o pessoal do serviço, game nights.

A gente não tinha muitos amigos (há pessoas com grupos e grupos de amigos), mas sempre estávamos próximos de uma maneira ou de outra. Muitas vezes bastava eu e a Claudia (já houve vezes em que ficamos o dia todo em casa sem fazer nada produtivo).

Acho que levávamos uma vida comum de classe média e não éramos infelizes. De repente posso dizer que eu era mais estressado e minha qualidade de vida não era tão boa. Por exemplo, eu não lembro de ter buzinado uma única vez desde que estamos aqui... e em São Paulo, eu buzinava quando ficava realmente inconformado com algumas coisas no trânsito.

Procurávamos participar das atividades familiares e não sei se posso dizer que meu relacionamento com meus pais e família era melhor ou pior. Talvez pelo fato de estar fisicamente próximo, eu me apoiava nesse fator para não procurar fazer coisas excepcionais junto (sair para comer fora ou estar completamente mais presente). Claro que quando se está fisicamente longe, algumas coisas começam a fazer falta e isso faz parte do aprendizado e adaptação.

Não sinto que era mais rico ou menos rico. Sinto sim que gastávamos pior o dinheiro que ganhávamos. A sensação de sacrifício para conquistar cada coisinha é mais evidente no Brasil... e acho que isso contribui também para a sensação de uma vida mais difícil.

Não lembro direito como eram meus valores no Brasil e teoricamente isso não deveria mudar, mas acho que de certa forma alguns valores mudaram. Por exemplo, minha visão do impacto que a desigualdade social causa, sustentabilidade, respeito, preconceitos, ... De repente o conjunto de mudanças me permite dizer que hoje sou mais paciente e de consciência tranquila.

Engraçado que das últimas vezes que estivemos no Brasil, tive a sensação de passar por lugares que pertencem a minha memória, mas que têm algumas  peças faltando. Será que algum dia eu terei apenas "flash" de memória? Espero que fiquem as lembranças boas somente, pois sempre vou querer me sentir de certa forma "em casa" quando eu voltar ao Brasil.

[]s

Um comentário:

Bia disse...

Para tudo... vc faz trico??????????